domingo, 6 de março de 2016

Desequilíbrio da economia é consequência de uma série de erros de gestão, diz Maílson da Nóbrega


Em entrevista à Agência CNI, o economista afirma que a inflação alta cria incertezas, dificulta o cálculo econômico, reduz a demanda e interfere nas decisões de investir das empresas

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Foto: Arquivo pessoal
 O ex-ministro da Fazenda do governo José Sarney, Maílson da Nóbrega, avalia que o atual quadro de inflação alta no Brasil é resultado de políticas equivocadas. Segundo ele, dificilmente a presidente Dilma Rousseff terá a liderança e a capacidade de articulação política para adotar as medidas necessárias à volta da estabilidade dos preços. "São medidas impopulares. A elas deve opor-se o próprio partido da presidente", disse o economista, em entrevista à Agência CNI de Notícias. Para Nóbrega, a restauração da credibilidade do Banco Central requer muitos anos de ação correta e convincente na política monetária. "Não acredito que isso possa acontecer no atual governo", completa. Confira a entrevista na íntegra.

Depois de conquistar a estabilidade, a inflação de 2015, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ficou em 10,67%. Como o Brasil chegou a isso?
Maílson – Na origem da alta inflação dos dias atuais está a leniência dos governos do PT com a alta de preços apesar do discurso de intransigência com a inflação. Em todo o seu período, mantiveram uma elevada média, de 4,5%, uma das mais altas do mundo. O padrão nos países emergentes é 3%. No Peru, é 2%. Além disso, políticas fiscal e de crédito expansivas contribuíram para acelerar o crescimento dos preços. Com Dilma Rousseff, a interferência política  prejudicou a credibilidade do Banco Central, minando o exercício de sua função básica de coordenar expectativas dos agentes econômicos. Por último, o controle de preços de combustíveis e energia elétrica criou distorções que obrigaram o abandono dessa política populista. A inflação elevada é, em grande parte, o efeito da correção de preços administrados.
 
Agência CNI: Como a inflação alta prejudica o desempenho das empresas e a vida dos cidadãos?
Maílson da Nóbrega – Nas empresas, a inflação cria incertezas, dificulta o cálculo econômico, reduz a demanda e interfere nas decisões de investir. Nos cidadãos, a inflação corrói a renda, diminui sua capacidade de consumo e poupança e pode, por seu efeito na atividade econômica, levá-los ao desemprego e a novas incertezas quanto ao futuro, o que afeta adicionalmente suas decisões de consumir. Os pobres são os mais prejudicados.
Há riscos da volta da indexação da economia? 
Maílson – Sim, embora no momento ainda não se possa dizer que tenha aumentado o nível de indexação. Diferentemente da época de indexação generalizada, ainda não há mecanismos institucionais de reajustes de preços e salários à inflação passada. Além disso, há notícias de renegociação de contratos e de seu reajuste abaixo da inflação. Na área dos salários, o crescimento da renda abaixo da inflação é sintoma de reajustes sem observância da inflação passada. Ao que tudo indica, muitas empresas conseguem demitir funcionários e substituí-los por outros de salários mais baixos, havendo casos de mera recontratação em outras bases. Se, todavia, a inflação fugir do controle, a indexação acabará sendo imposta como uma decorrência da realidade.

Quais as medidas necessárias para combater a inflação e recuperar o equilíbrio econômico?
Maílson – Duas medidas são essenciais. Primeira, enfrentar e resolver o problema fiscal de modo a permitir a geração de superávits primários robustos, da ordem de 3% do PIB ou mais. Segunda, restabelecer a credibilidade do Banco Central, seriamente abalada com os sinais de interferência da presidente Dilma na recente decisão do Copom, de manter a taxa Selic em 14,25% ao ano. Sem essas duas medidas, os gastos públicos continuarão pressionando a demanda e o BC não recuperará seu papel de coordenador das expectativas.

O senhor acredita que o governo tomará essas medidas? E o Congresso apoiará tais medidas?
Maílson - Não creio. No campo fiscal, o ajuste inclui eliminar a indexação de despesas como as de Previdência, educação e saúde, rever as regras de reajuste do salário mínimo e aprovar a recriação da CPMF. Dificilmente Dilma tem a liderança e a capacidade de articulação política requeridas para obter o apoio do Congresso em prol de medidas como essas, que são impopulares. A elas deve opor-se o próprio partido da presidente. Quanto à credibilidade do Banco Central, sua restauração vai requerer muitos anos de ação correta e convincente na política monetária. Não acredito que isso possa acontecer no atual governo.

Como as empresas e os cidadãos podem se proteger da inflação alta?
Maílson - Nas empresas, a saída é buscar ganhos de eficiência que permitam aumentar a produtividade e elevar sua competitividade. Nos cidadãos, os instrumentos de defesa contra a inflação estão disponíveis essencialmente para os que têm poupança financeira para aplicar em ativos que rendam pelo menos a taxa de inflação. Para as classes menos favorecidas, infelizmente, as chances de defender-se se limitam quase sempre à busca de preços mais baixos disponíveis no mercado e às compras realizadas logo que disponham de seus rendimentos.

 Quais foram as principais medidas que contribuíram para o atual desequilíbrio da economia brasileira?
Maílson - O atual desequilíbrio é a consequência de uma série incrível de erros de gestão econômica. Começa pela interrupção, por razões ideológicas, do processo de reformas destinadas a reforçar o papel do mercado na economia brasileira e de promover ganhos de produtividade. Passa por erros de diagnóstico, particularmente no período Dilma, quando prevaleceu a ideia equivocada de que o Brasil enfrentava um problema de demanda (era de oferta). A expansão insustentável do crédito e a pletora de incentivos fiscais, com o objetivo de estimular o consumo, geraram pressões inflacionárias, diminuíram a arrecadação tributária, agravaram a crise fiscal e asseguraram reajustes salariais acima da produtividade (o que reduziu drasticamente a competitividade da indústria). As intervenções desastradas no setor elétrico e nos preços de combustíveis fragilizaram o setor elétrico e a Petrobras, e inviabilizaram muitas plantas de produção de etanol. A corrupção na Petrobras e sua consequência, a Operação Lava-Jato, reduziu os investimentos da cadeia de petróleo, criou gigantescas incertezas e constitui uma causa importante da desaceleração da economia brasileira. Dificilmente há paralelo de tanta inépcia na história do país.

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